O dia começou
comum, e desde o momento em que abriu os olhos ela já sabia qual seria o
movimento seguinte.
Levantar, fazer
xixi, escovar os dentes, tomar banho, escolher uma roupa qualquer, tomar o café
com o pão de ontem e sair.
Um pouco antes
de levantar-se da mesa com a mesma toalha da semana anterior,
pensou se hoje, só hoje, algo poderia ser diferente, e ficou assim com o olhar
parado por alguns segundos, fixando um ponto qualquer entre o teto e a parede
da cozinha.
Nunca foi
pessoa de devaneios, considerava-se rápida, prática e decidida, sempre achou
que sonhos eram para os desocupados, sem compromissos ou para os artistas, estes
sim podiam sonhar, por que tinham tempo para isso, mas não ela.
Levantou-se
rápido, como que despertando de um pequeno transe e voltou ao quarto para
buscar um casaco, o tempo não estava bom.
O emprego de
faxineira em uma padaria não era lá grande coisa, mas pagava o aluguel do
pequeno quarto e sala, e ás vezes ao final do mês, sobrava um troco para uma
besteirinha qualquer.
Mas este mês
não sobrou nada.
O caminho entre
o quarto e a porta de saída era feito através de um pequeno corredor, que
tempos atrás enfeitou com alguns retratos de família e a imagem de sua santa de devoção a Nossa Senhora das Graças.
Levara bastante tempo
organizando de forma metódica as fotos para que estivessem cronologicamente
corretas.
Esta tarefa foi seu passatempo
por vários dias.
Ficou até triste quando terminou, mas pelo menos
agora, as fotos haviam saído da caixa de
sapatos e finalmente estavam com alguma dignidade, apesar de estar triste
estava também satisfeita por ver sua história ali, resumida em pequenas
fotografias expostas como janelas de um passado que por vezes ela sorria ao
lembrar e outras a faziam chorar.
Mas bem
pouco, só um pouquinho mesmo.
Normalmente
passava rápido por ele, quase sempre atrasada apenas com o tempo de pegar a
chave em cima de uma mesinha pequena que fazia questão de manter com um guardanapo
de crochê e um abajur de tulipa.
Estes dois
objetos eram as únicas lembranças da mobília de sua mãe, foi o que conseguiu
carregar quando foram jogadas na rua. Dia que não quer lembrar.
Passou pelo
corredor um pouco mais devagar hoje, nem se deu conta, mas parou o olhar numa
foto, outro pequeno devaneio e um segundo de memória a fez baixar os olhos.
Chega! Pensou.
Chega mesmo!
Celine vestiu o
casaco, pegou sua bolsinha pequena e a colocou atravessada como faz sempre,
abriu a porta e saiu. Fez certo de pegar o casaco, pois assim que chegou à rua
foi recebida por uma rajada de vento.
Fechou o casaco rapidamente, pegou
um elástico e prendeu o cabelo, coisa chata é o vento fazendo o cabelo voar no
rosto, pensou.
Estando pronta, começou a percorrer em passos rápidos o caminho para o ponto
de ônibus que por sorte a deixava a meia quadra do seu trabalho.
Continua...
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